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Renascimento

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Fenómeno eminentemente cultural, incidindo na literatura, artes plásticas, história, educação, ciência, filosofia moral e política, registado entre a segunda metade do séc. XIV e os primórdios do séc. XVII em vários países da Europa ocidental. Iniciado em Itália ( Florença ) com o Humanismo, irradiou para outros países europeus, adquirindo e combinando - se com características próprias das respectivas culturas nacionais. Embora o vocábulo tenha sido primeiramente utilizado por Balzac no romance Bal de Sceaux (1829) e só adquira significado corrente com Histoire de France (1833) de Michelet e A Civilização do Renascimento em Itália (1860) de J. Burckhardt, não subsiste a mínima dúvida de que os contemporâneos dos sécs. XV e XVI se encontravam convencidos de viver numa época nova, de re-nascença ou renovatio, que contrastavam com ‘as trevas’, barbárie e rudeza do período milenar intermédio que os separava da Antiguidade Clássica. Esta perspectiva, divulgada pelos humanistas e que perdurou até aos nossos dias mercê da grande influência do livro de Burckhardt, merece hoje reservas de vária ordem, quer pelo reconhecimento da existência de períodos anteriores caracterizados por grande interesse na cultura da Antiguidade Clássica ( renascimento carolíngio e o do séc. XII, famoso pela recuperação de várias obras de Aristóteles), quer pela impossibilidade de considerarmos rudes e selvagens os arquitectos e artesãos responsáveis pela construção das catedrais góticas, quer ainda por um grau assinalável de continuidade entre a Idade Média e o Renascimento.

O Renascimento italiano inicia - se com a avidez manifestada pelos humanistas em descobrir e recuperar os textos originais das obras de autores da Antiguidade greco - latina, não já e só para ilustrarem pontualmente casos morais, mas como veículos privilegiados de acesso a toda uma civilização antiga, bem mais rica e complexa do que a tradição medieval transmitira. Para além dos contributos precursores de Dante (1265-1321) e Bocaccio (1313-75) na literatura e de Giotto (c.1266-1337) na pintura, o papel desempenhado por Petrarca (1304-74) afigura-se decisivo na reacção contra o ensino considerado insatisfatório e inútil da Escolástica e respectiva ênfase excessiva em valores transcendentes, tal como na nova perspectiva histórica de encarar os autores clássicos no respectivo contexto secular e na utilização dos valores por si transmitidos, especialmente o republicanismo da Roma antiga. Com Petrarca, Coluccio Salutati (1335-1405), o futuro secretário papal Poggio Bracciolini (1380-1459) e a cadeira de grego instituída no ano de 1396 em Florença e assegurada por Manuel Chrysoloras (1350-1415), estabelece-se a primazia do latim e grego clássicos, a necessidade de recuperar os originais—lema ad fontes conducente a um esforço intenso de busca de manuscritos—e a de proceder à análise crítica de variantes do mesmo texto, culminando na fundação da filologia e na supremacia das humanidades (gramática, retórica, poesia, história e filosofia moral), consolidada a partir de meados do séc. XV por Lorenzo Valla (1407-57) e Angelo Poliziano (1454-94), entre outros.

Constituindo no início pequenas células dispersas de leigos e eclesiásticos entusiastas das letras clássicas, os humanistas conseguem atingir no séc. XV dimensão e influência significativas mercê do mecenato de mercadores, burgueses abastados, nobres e condottieri de cidades italianas como, por exemplo, Florença, Veneza, Siena, Génova, Pádua e Milão. Num enquadramento caracterizado por guerras frequentes mas também de acentuado progresso económico, os detentores do poder político das Cidades-Estado italianas e, em particular, de repúblicas como Florença, patrocinam as actividades dos humanistas e artistas plásticos por desejos de fama e glória pessoal, por patriotismo para com a sua respectiva Cidade e por se terem apercebido da relevância prática e actual das obras de filosofia política de Platão e Aristóteles, de oratória de Cícero e Quintiliano, e de ética e história de Séneca, Marco Aurélio, Tito Lívio, Plutarco, Heródoto, Tucídides e Políbio. Os valores de liberdade, igualdade e activa participação política dos cidadãos, típicos do republicanismo clássico, são assimilados pelas repúblicas italianas que os utilizam na defesa concreta da respectiva autonomia política. Por outro lado, esta identificação estreita com os ideais da Roma clássica republicana e o melhor conhecimento do passado têm consequências paradoxais de distanciamento, traduzido numa consciência aguda de anacronismos medievais e da especificidade histórica da Antiguidade, para além de uma outra de grande alcance futuro: a história deixa de ser considerada em função da ortodoxia teológica da Igreja e seculariza-se, passando a ocupar-se de um mundo feito pelo homem, como ilustram as obras de Maquiavel (1469-1527) e Guicciardini (1483-1540). Deste modo, a relevância prática do conhecimento histórico, da filosofia política, da ética e da oratória clássicas, aliada à fixação e tradução dos textos e maior acessibilidade dos livros proporcionada pela invenção decisiva da imprensa por Gutenberg em meados do séc. XV, tem repercussões notórias na educação das élites urbanas, contribuindo para a divulgação crescente de um curriculum alternativo que combinava o estudo das humanidades com a prática regular de exercícios físicos.

A crença no carácter modelar da Antiguidade greco-latina e respectiva influência secularizante, tal como o cada vez maior interesse despertado pelo Homem e sua natureza, manifestam-se ainda em Itália pelo florescimento exuberante das artes plásticas que parece justificar a tese de Burckhardt sobre a originalidade italiana e paganismo implícito. Importa referir, porém, que a Itália não foi o único centro inovador: nos Países Baixos, Jan van Eyck e Roger van der Weyden aperfeiçoaram nos primórdios do séc. XV a técnica da pintura a óleo que viria a ser muito apreciada pelos italianos; por seu turno, na área cultural alemã, Hans Holbein (1497-1541) e Albrecht Durer (1471-1528) desenvolveram temas e formas de representação diversos do sentido de equilíbrio e harmonia convencionais da pintura renascentista italiana. Isso em nada diminui o extraordinário valor da descoberta da perspectiva e das muitas e variadas obras de Brunelleschi (1377-1444), Luca della Robia (1400-82), Botticelli (1445-1510), Leonardo da Vinci (1452-1519), Rafael (1483-1520) e Miguel Ângelo (1475-1564), servindo antes para realçar que, como fenómeno europeu, o Renascimento excede os êxitos italianos e concretiza-se também nos Descobrimentos portugueses e espanhóis, nas obras de Erasmo, More e Rabelais, Camões e Shakespeare, Montaigne e Cervantes.

Em França, a influência renascentista italiana no âmbito das artes plásticas encontra - se associada às campanhas militares desenvolvidas pela dinastia Valois em Itália nos finais do séc. XV, sendo notória a partir de 1495 pela introdução crescente de motivos clássicos e alusões mitológicas em castelos e mansões senhoriais de estilo gótico. O palácio imponente de Chambord, mandado construir de raiz por Francisco I em 1519 e terminado em 1550, constitui um exemplo da forte influência renascentista italiana de gosto classicizante que, também na pintura, floresceria no séc. XVI, mas também do emprego continuado de símbolos régios e tradições arquitectónicas francesas de origem medieval. Todavia, iniciado em meados do séc. XV e, por isso, bem anterior ao convencional ponto de viragem de 1495, o movimento humanista francês atinge elevada craveira com os eruditos Guillaume Budé ( 1468 - 1540 ), famoso pela renovação dos estudos jurídicos, e Jacques Lefèvre d’Étaples ( 1455 - 1536 ) - autor das primeiras edições fidedignas de todas as obras de Aristóteles, e contribui de forma decisiva para a simbiose original de classicismo e tradição nacional francesa, patente nas obras de Ronsard ( 1524 - 1585 ) e Rabelais (1483 - 1553). O mesmo acontece no último quartel do séc. XVI com a publicação dos Ensaios ( a partir de 1580 ) por Montaigne ( 1533 - 1592 ) que, demonstrando sólidos conhecimentos dos Antigos, ousa adoptar uma inovadora voz intimista (Eu...) e assumir o carácter falível das suas obras, denominando - as ensaios ou tentativas, assim originando uma forma de escrita hoje extremamente divulgada.

Em Portugal, para além dos contactos frequentes com humanistas e impressores italianos já no séc. XV, o classicismo renascentista italiano nas artes plásticas não obteve repercussão de monta; os Painéis de S. Vicente (c.1465), de Nuno Gonçalves, constituem a obra mais notável e denotam influência assinalável da pintura flamenga. Já em Os Lusíadas (1571), de Luís de Camões, em que o aproveitamento da mitologia clássica é óbvia, a criatividade do autor excede claramente a fonte de inspiração. Um processo semelhante ocorreu em Espanha na literatura e nas artes plásticas. O estímulo crescente do humanismo italiano a partir do reinado de D. João II de Castela (1406-1454) conduz ao fomento de estudos clássicos e de análise filológica dos originais da Bíblia, representado por Antonio de Nebrija (1444-1522), autor da gramática Introdução ao Latim (1481) e colaborador da Bíblia Poliglota Complutense (1514-1517), além de estimular a curiosidade pelo passado hispânico longínquo, presente na quantidade apreciável de ruínas. Já a poesia de amor petrarquiano e outras formas poéticas italianas e clássicas, praticadas por Garcilaso de la Vega (c.1501-1536) e Juan Boscán (c.1492-1542), combinam rigor técnico com temas e motivos cavalheirescos, específicos do Renascimento espanhol, ilustrados de sobejo pelo romance vernáculo Amadis de Gaula ( 1508 ), de García Ordóñez de Montalvo. De facto, este romance de cavalaria, que conseguiu ser o livro mais vendido internacionalmente e objecto de inúmeras imitações, simboliza a permanência de ideais tardo - medievais na Espanha do século de ouro e uma tradição genuína e específica que, de forma irónica, culmina com a sua crítica genial: Dom Quixote (1605) de Cervantes. Na arquitectura, o Escorial constitui um exemplo da influência renascentista clássica, mas depurado de decoração, ao passo que a fachada da Universidade de Salamanca, de princípios do séc. XVI, ilustra o plateresco, um estilo de transição resultante da simbiose de ideais arquitectónicos renascentistas com tradições flamengas mais antigas. Também na escultura e pintura ocorre um fenómeno semelhante, como nos retratos e retábulos de Pedro Berruguete, activo de 1483 a 1504, em que se combinam elementos góticos e florentinos, cabendo a El Greco (1514-1614) os louros de maior e extraordinária originalidade.

Deste modo, embora o desnudamento do corpo humano na pintura e escultura renascentista italiana e francesa e o emprego de alusões de influência clássica na literatura europeia possam ser entendidos como manifestações de paganismo, a substituição da religião cristã pelos deuses gregos e romanos nunca foi encarada - salvo raras excepções - pelos renascentistas que, por vezes, não deixaram de se aperceber de algumas tensões implícitas entre os dogmas cristãos e os valores e representações do mundo clássico. Assim, a complexidade do Renascimento deriva não tanto de rupturas, mas da coexistência do tradicional e do inovador, e da presença - julgada compatível - de tradições diversas como a clássica, a cristã, a hermética (do egípcio Hermes Trimegisto) e a da Cabala judaica, que os cristãos neoplatónicos Pico della Mirandola (1463-94) e Marsílio Ficino (1433-99) tentaram harmonizar.

A Oração sobre a Dignidade do Homem, escrita por Pico em 1486, constitui exemplo emblemático desse sincretismo e de uma perspectiva do homem que se encontra implícita na diferenciação habitual entre o Renascimento meridional, caracterizado pela supremacia da vertente estética, e o nórdico ou setentrional, pela primazia conferida à ética. Dito de outro modo, o humanismo cívico e secular das repúblicas italianas estaria profundamente relacionado com o egocentrismo, o individualismo económico e a exuberância do corpo humano, patente na pintura e escultura, opondo-se ao humanismo cristão representado por Erasmo (1466-1536) e Thomas More (1478-1535) - que consideravam o saber dos Antigos um auxiliar do cristianismo - e às preocupações morais dos humanistas alemães e da Reforma. Além de tal distinção dever ser considerada um mero ponto de partida analítico, importa realçar que Pico, ao recorrer a obras das mais diversas tradições para manifestar incontível júbilo e admiração pela capacidade - e livre arbítrio implícito - de o género humano poder aproximar-se tanto dos anjos como das bestas, afirma a dignidade e excelência do Homem num mundo governado por Deus e não por divindades pagãs. O optimismo indesmentível de Pico sobre as inúmeras potencialidades da natureza humana contrasta de modo inovador com o pessimismo medieval, de influência agostiniana, mas inscreve - se na ortodoxia cristã, visto que as qualidades excepcionais do Homem dependem, em última análise, do seu Criador e não dele próprio.

Por outro lado, o caso inglês constitui um exemplo paradigmático da cautela recomendável na caracterização do Renascimento setentrional, atendendo a duas tendências bem diversas. A primeira, marcante de meados do séc. XV até cerca de 1580, corresponde à recepção, desenvolvimento e decadência gradual do Humanismo; a segunda, de 1580 até 1626, coincide com o apogeu do teatro isabelino e as obras de Marlowe (1564-93), Shakespeare (1564-1616) e Ben Jonson (1572-1637), além dos escritos filosóficos de Francis Bacon (1561-1626). O contacto pessoal dos ingleses com humanistas proeminentes, iniciado já na década de 1430 por Humphrey, Duque de Gloucester, com Leonardo Bruni, e desenvolvido por Grocyn (?1446-1519), Linacre (?1460-1524) - ambos discípulos de Poliziano, Colet (?1467-1519) - aluno de Ficino, e Thomas More, amigo de Erasmo, permite-lhes um acesso fácil aos originais gregos e latinos que se traduz numa forte influência directa do platonismo, conjugada com os ideais de desprendimento, rectidão moral na vida quotidiana, frugalidade e comunitarismo do movimento Devotio moderna, fundado no séc. XV nos Países Baixos. Além de deixar transparecer tais influências, Utopia (1516) de More debruça-se sobre injustiças da organização sócio-económica, sobre a guerra e o recurso a mercenários, a educação, a tolerância religiosa e, de forma caracteristicamente renascentista, interroga - se sobre o melhor sistema prático de governo e os ideais de vida activa e contemplativa. The Book named the Governor (1531) de Thomas Elyot e The Schoolmaster (1570) de Roger Ascham aprofundam os assuntos da política e da educação, mas não modificam os moldes, pelo que a busca de equilíbrio e as preocupações morais predominantes se inscrevem no conceito de Renascimento setentrional.

Todavia, além de a década de 1570 permitir identificar já a existência de um culto visando a glorificação da personalidade da raínha Isabel I, resultante da simbiose de ideais cavalheirescos, cristãos e clássicos, a produção dramática de Marlowe e Shakespeare a partir da década de 1580 altera as coordenadas vigentes de forma inovadora e radical, quer pelo clima frequente de irreligiosidade e presença subjacente da deusa Fortuna, quer pela representação e análise de profundas e violentas emoções humanas como o ciúme, a traição, o assassínio, a avareza, a luxúria, a ambição desmedida pela riqueza, pelo poder e pelo conhecimento. Dr. Faustus (?1588), de Marlowe, símbolo desta tripla ambição que conduz o estudioso Fausto a celebrar um pacto com Mefistófeles, constitui um paradigma do homem renascentista na sua ânsia de ultrapassar os limites do conhecimento humano; por seu turno, Ricardo III, Othelo, Macbeth e Hamlet são várias de muitas outras personagens shakespearianas que ilustram dramaticamente facetas do indivíduo concreto, com particular incidência na dissimulação e trapaça, no ciúme, na ânsia e luta pelo poder, na desconfiança e na necessidade de auto-conhecimento. Em resumo, se até cerca de 1580 o Renascimento em Inglaterra se identifica com os valores dominantes do Humanismo cristão, o Renascimento inglês propriamente dito, representado pelo teatro isabelino, revela a presença do pensamento secular de Maquiavel e Guicciardini, de várias influências cristãs medievais e da ênfase no indivíduo identificada por Burckhardt, caracterizando-se mais pelo excesso e desmesura do que pela busca de equilíbrio. Porém, por mais paradoxal que pareça e a exemplo da coexistência referida de tradições diversas em Itália, França, Portugal e Espanha, esta época áurea da cultura inglesa coincide temporalmente com a divulgação e influência crescentes do Puritanismo, herdeiro directo da Reforma.

Fausto e respectiva sede inesgotável de saber, tal como a alusão a Francis Bacon, remetem para um outro traço renascentista fundamental que excede o âmbito do Humanismo e se reporta à matemática e à filosofia natural (física). Movidos pelo imperativo de recuperar e traduzir todos os textos da Antiguidade greco-latina e de outras culturas, como a egípcia e a hebraica - directamente relacionada com a Bíblia, os humanistas traduziram e divulgaram obras de magia e as de Euclides, Arquimedes, Galeno, Plínio, Teofrasto, Ptolomeu, Platão, Aristóteles e Lucrécio. O emprego do cálculo matemático e a cada vez maior importância atribuída ao conhecimento empírico dos materiais, do homem e do mundo, desempenham papel relevante nas obras de Brunelleschi, Leon Battista Alberti e, em especial, Leonardo da Vinci, mas não constam do elenco habitual dos humanistas; ter-se-ia de esperar por Galileu, nos primórdios do séc. XVII, para inaugurar a matematização da física. Além disso, importa realçar que, como bem demonstrou Frances Yates, a matemática se encontrava associada bem mais a conhecimentos hermético - ocultistas do que à técnica rigorosa de cálculo hoje reconhecida e praticada. Por esse motivo e por defender a teoria heliocêntrica contrária à regra da fé, De revolutionibus orbium coelestium de Copérnico (1473-1543) foi apresentado pelo prefaciador Osiander como mera hipótese matemática, perfilhada em 1576 por Thomas Digges e desenvolvida a partir da década de 1580 por Thomas Harriot (1560-1621), astrónomo e matemático simpatizante da concepção atomista do universo, que não publicou as suas obras para evitar ser encarcerado sob a acusação de ateísmo. Simbolizando o interesse renascentista pelo conhecimento baseado na experiência, importa ainda referir On the Fabric of the Human Body (1543) do flamengo Andreas Vesalius (1514-64) que muito contribuíu para o fomento do estudo da anatomia humana, que se prolongaria pelo séc. XVII. Neste contexto, as obras de Fr. Bacon The Advancement of Learning (1605), Novum Organon (1620) e De Augmentis Scientiarum (1623) representam, mais do que uma chegada, um ponto de partida decisivo ao criticarem a esterilidade da Escolástica, a degeneração imitativa (Ciceronianism) do Humanismo e ao proporem o método empírico-experimental para reconstruir o conhecimento científico desde a base sem intervenção da teologia.

Constituindo no início um fenómeno urbano e elitista em várias cidades-repúblicas italianas que visava recriar a civilização greco-latina em toda a sua plenitude, o Renascimento afirmou-se inicial e particularmente pelo Humanismo que conseguiu forjar um grau assinalável de comunhão de pressupostos, métodos e objectivos entre estudiosos de vários países europeus, resultante no cosmopolitismo. Porém, o modo e grau de aproveitamento dos valores transmitidos pelos Antigos divergiram de país para país, dependendo da época, da criatividade e de factores políticos, religiosos e sócio-económicos específicos; a imitação dos Antigos não raro consistiu no modo privilegiado de veicular inovações tanto nas artes plásticas como nas humanidades, salientando-se nestas últimas o florescimento das línguas vernáculas. Além disso, a ânsia inesgotável de saber, traduzida na busca humanista de manuscritos, concretizou - se a partir do séc. XV - de forma gradual e variável - na curiosidade pelas vertentes psicológica, moral e política do homem, pela análise empírica e anti-escolástica do mundo e pelo descobrimento de novos mundos. O Renascimento constitui pois um fenómeno eclético e um período charneira na história da Europa, que, para além dos muitos êxitos específicos, prepara a ruptura epistemológica seiscentista.

BIBLIOGRAFIA. Burckhardt, J. A Civilização do Renascimento em Itália (1860); Brown, A. The Renaissance (1990) ; Burke, P. The Renaissance (1997) ; Davies, S. (ed.), Renaissance Views of Man (1978); Ford, B. (ed.), The Cambridge Guide to the Arts in Britain: Renaissance and Reformation, vol. 3 (1989); Green, V.H.H. Renascimento e Reforma (1964; 1991); Martindale, J. (ed.), English Humanism: Wyatt to Cowley (1985); Moser, Fernando de Mello, Tomás More e os Caminhos da Perfeição Humana (1982); Murray, C. (org.) História do Renascimento (1997); Yates, F. The Occult Philosophy in the Elizabethan Age (1980).

Júlio Carlos Viana Ferreira

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