Anúncio provido pelo BuscaPé

LÉXICO

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

1. Conjunto das unidades significativas de uma dada língua, num determinado momento da sua história. Em sentido lato, é sinónimo de vocabulário. Alguns linguistas relacionam o par léxico/vocabulário com as oposições preconizadas por Saussure entre langue/parole. As unidades virtuais do léxico, actualizar-se-iam no discurso.

As unidades do léxico são os lexemas, por oposição às unidades da gramática, os gramemas ou morfemas gramaticais. Também podem ser designadas por monemas lexicais (O termo monema remonta a Frei e foi divulgado por Martinet, Escola Funcionalista) ou morfemas lexicais (Bloomfield, Escola Americana). Os monemas lexicais têm um conteúdo semântico que aponta para relações extra-linguísticas, por oposição aos morfemas gramaticais, cujo conteúdo semântico é intra-linguístico, ou seja, aponta para relações do foro gramatical. Por exemplo, mar é um lexema, e o chamado “género”, neste caso masculino, é um morfema gramatical. O “mesmo” lexema mar em francês, selecciona o “género feminino”, por isso dizemos que o conteúdo semântico dos morfemas gramaticais é intra-linguístico. Fala-se de estrutura lexical ou sistema lexical, para se referir o modo como as unidades do léxico de uma dada língua se organizam.

O léxico é o objecto de estudo da lexicologia. Diz-se comummente que as unidades lexicais constituem sistemas abertos (ou inventários ilimitados), ao passo que as unidades gramaticais constituem sistemas fechados. Nesta acepção, léxico opõe-se a gramática, dado que o léxico é um sistema aberto e a gramática um sistema fechado. Não obstante, as fronteiras entre estes dois domínios linguísticos nem sempre são facilmente identificáveis, começando as dificuldades na própria inventariação das unidades de cada sistema. Podemos identificar transferências de um campo a outro. Falamos de lexicalização a propósito de estruturas como fazer perguntas, fazer troça, dar apoio, dar mimo (que coexistem na língua com perguntar, troçar, apoiar, mimar ), onde o primeiro elemento é o chamado verbo suporte (opõe-se-lhe a noção de verbo pleno), semanticamente vazio ou quase, e cuja função é “carregar” os monemas gramaticais compatíveis exclusivamente com a classe verbal, também designados modalidades, que são o tempo e o modo . A carga semântica, por seu turno, está presente no substantivo. Falamos de gramaticalização ou deslexicalização, entre outros fenómenos, no que respeita ao funcionamento de verbos plenos como verbos suporte . Considere-se : 1- Dei um bolo ao João, 2 - Dei uma bofetada ao João. Em 1, dar funciona como verbo pleno, desempenhando a função sintáctica de predicado, um bolo, preenchendo a função sintáctica de complemento directo. Em 2, dar é um verbo suporte e só podemos identificar o predicado com a estrutura dar uma bofetada (esbofetear), sendo impróprio fazermos a identificação de uma bofetada como preenchendo a função de complemento directo. Atente-se ainda nos múltiplos factos linguísticos que se situam no limiar de ambas as disciplinas, dos quais são mero exemplo os problemas relacionados com unidades como bola-bolo, cesto-cesta, papo-papa, rola-rolo, sino- sina, etc.

Sublinhe-se também que o léxico não é um sistema homogéneo, e será mais legítimo falar de vários subsistemas do léxico, dado que no léxico coexistem palavras do quotidiano, da escrita, da oralidade, neologismos, arcaísmos, estrangeirismos, vocabulários técnicos, vocabulários regionais, sociais, etc.

Os léxicos de línguas diferentes não são meras listas de palavras que possamos relacionar biunivocamente de uma língua a outra. Uma mesma realidade extra-linguística (o referente) pode ser “traduzida” de modo muito diferente por duas línguas geneticamente aparentadas. Considerando línguas da família indo-europeia, de origem latina como o português ou o francês, vemos que há diferenças importantes ao nível da estrutura lexical. Dizemos em português fazer uma pergunta. Em francês já não podemos usar o verfo faire, tradução literal de fazer, pois na língua francesa, a estrutura lexical eleita é poser une question. Em português, temos os verbos almoçar, lanchar, jantar e cear, para referir várias refeições que se tomam ao longo do dia. Não temos, porém, um verbo para referir a primeira refeição do dia e somos “obrigados” a usar um grupo de palavras como tomar o pequeno almoço. No espanhol, contrariamente, existe um verbo específico para referir a acção de tomar o pequeno almoço : desayunar. Os exemplos poder-se-iam multiplicar ad infinitum, mas o nosso propósito é simplesmente sublinhar o carácter convencional dos lexemas e estruturas lexicais, e ainda o seu diferente valor de língua para língua dado que as unidades estabelecem relações opositivas e contrastivas ( ou se preferirmos, relações paradigmáticas e sintagmáticas) diferentes de sistema para sistema e isso determina, ou condiciona o seu valor.

Na gramática gerativa (ou generativa), o léxico tem um lugar de destaque, pois abrange a componente que contém todas as propriedades estruturais dos itens lexicais, isto é, a especificação morfofonológica, os traços sintácticos, categoriais e contextuais.

Diz-se unidade lexicalizada a entidade constituída por várias palavras gráficas que sofreu um processo progressivo de fixação: bater as botas (morrer), dar às de vila diogo (fugir), Há mar e mar, há ir e voltar.



2. Léxico (do grego lexis - palavra) pode ainda ser usado na acepção de dicionário de uma língua, ou seja, conjunto de palavras ordenado, “tesouro de palavras, disposto como está num dicionário ” (Saussure, 1986 : 305). De acordo com Mário Vilela, “o léxico é a parte da língua que primeiramente configura a realidade linguística e arquiva o saber linguístico duma comunidade” (1994 : 6). Tudo o que faz parte das vidas dos seres humanos tem um nome, nome esse que é parte integrante do léxico. O léxico abrange o saber linguístico partilhado pelos falantes e existe na sua totalidade no grupo formado pelos falantes da comunidade linguística em causa.



LEXICOLOGIA



Bib. : Assunção Júnior, António, 1986, Dinâmica Léxica Portuguesa, Rio de Janeiro, Presença; Coseriu, E., 1979, “A perspectiva funcional do léxico”, in AAVV, Problemas da Lexicologia e Lexicografia, Porto, Livraria Civilização-Editora; Cruse, D., 1987, Lexical Semantics, Cambridge, CUP; Galisson, R. e Coste, D., 1983, Dicionário de Didáctica das Línguas, Coimbra, Livraria Almedina; Lepschy, G., 1984, “Léxico”, in Enciclopédia Einaudi, vol. 2, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lüdtke, Helmut, 1974, Historia del Léxico Románico, Madrid, Gredos ; Martinet, A. (dir.), s/d, Conceitos Fundamentais da Linguística, Lisboa, Editorial Presença; Nascimento, F. et all. 1984, Português Fundamental, 3 vol., Lisboa, INIC-CLUL, Saussure, F. , 1986, Curso de Linguística Geral, Lisboa, Dom Quixote, ; Vilela, Mário, 1994, Estudos de Lexicologia do Português, Coimbra, Almedina; idem, 1995, Léxico e Gramática, Coimbra, Almedina;

Maria João Marçalo

0 comentários: