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Sentindo o cheiro da noite

terça-feira, 24 de novembro de 2009

[De sin - + gr. aísthesis, «sensação» + - ia] Processo estilístico que consiste na associação, pela palavra, de duas ou mais sensações pertencentes a registos sensoriais diferentes. A utilização de tal figura de retórica permite a transposição de sensações, ou seja, a atribuição de determinadas impressões sensoriais a um sentido que não lhes corresponde. Por exemplo, na expressão “aquela cor é gritante”, a percepção visual (cor) como que é ouvida, processo que acentua a intensidade da mesma.

A sinestesia é uma figura de retórica que surge intimamente ligada à metáfora e à imagem, como o podem exemplificar os seguintes versos de Mário de Sá Carneiro – “Insónia roxa. A luz a virgular-se em medo./ O aroma endoideceu, upou-se em cor, quebrou/Gritam-se sons de cor e de perfumes”. Tal situação levou mesmo alguns linguistas a considerar este procedimento estilístico como um tipo de metáfora ou, até mesmo, um grau de metáfora, de acordo com o crítico J. Cohen , ideia à qual a retórica antiga não foi alheia, referindo-se à sinestesia como uma metáfora afastada.

Embora já fosse utilizada na literatura grecolatina, a sinestesia alcança maior notoriedade com os poetas barrocos e simbolistas, tais como Quevedo, Baudelaire, Rimbaud, Verlaine, etc. Durante o período barroco, esta figura de retórica foi inclusivamente considerada, juntamente com a hipérbole, a antítese e a metáfora, como uma das que melhor servia os ideais estéticos de deleite e deslumbramento do leitor. Recorde-se, a propósito, o conhecido soneto de Rimbaud – “ A noir, E blanc, I rouge, U vert, O bleu (...)” - ou os seguintes versos de Quevedo e de Tomás Pinto Brandão respectivamente- “Si mis párpados, Lisi, labios fueram,/ besos fueram los rayos visuales/ de mis ojos (...)”; “mostrando pura/Candidez, com afagos transparentes/Beija na face as flores e as murmura”.

Bib: Fernandes Agudo: Noções de Estilística (1945); Heinrich Lausberg: Elementos de Retórica Literária (1993); Jean Cohen: Estrutura da Linguagem Poética (1973); Michel le Guern: Semântica da Metáfora e da Metonímia (1974); Pierre Fontanier: Les Figures do discours (1977);

Carla Sofia Caneiro Escarduça

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