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Personagem

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Termo derivado do latim persona que significa máscara, e do grego prosopon que significa rosto e é utilizado no teatro como o jogo entre o verdadeiro e o falso. Na antiguidade clássica os actores entravam muitas vezes em cena disfarçados com máscaras que, à partida, marcavam a diferença ente o actor (pessoa) e o seu papel a representar , a sua personagem. No entanto na dramaturgia posterior a personagem vai passar por um processo de identificação progressiva com o actor contribuindo para a definirmos como um ser individual e personalizado. No entanto a personagem é sempre um ser que domina no hemisfério do imaginário, apresentado por um actor real que salienta e evidencia alguns aspectos visuais e auditivos da figura que pretende representar, acabando por lhe dar poderes que confundem muitas vezes o leitor ou espectador, ou seja discernir a verdade a partir da qual a personagem foi criada e o espaço que domina ,é muitas vezes uma tarefa árdua. A personagem acaba por ser uma figura coerente, uma vez que é criada a partir da observação do real, como tal, quem a cria pode atribuir-lhe um carácter rico e exemplar, uma vez que a sua esfera de acção, os seus actos são sempre limitados pelo mundo imaginário onde a acção se desenrola pela pena de quem a cria. Ficcionalmente as personagens são mais ricas que as pessoas reais, uma vez que neste domínio, as últimas são de somenos importância.
É através do nosso olhar enquanto observadores que o autor, criador das personagens, nos dirige até aos aspectos que ele próprio elaborou nessa figura de ficção, tornando-a em si só, uma fonte inesgotável e ao mesmo tempo insondável, visto que a sua capacidade de retenção do real é tão grande que tudo nela é permitido e esperado. A personagem assume assim uma condição universal que em nada reduz as suas capacidades enquanto ser necessário para o desenvolvimento de um enredo. Assim, o observador – leitor – contempla e ao mesmo tempo vive esse mesmo enredo, as mesmas vivências da personagem como se de um ser real se tratasse, desfrutando ao mesmo tempo de todo o prazer estético que nela se encerra. A ficção é pois esse lugar privilegiado em que o homem pode viver e contemplar através das várias personagens, a plenitude da sua própria condição.
Quando se fala de personagens não se pode deixar de referir a importância da vida que as mesmas vivem, as situações que têm de enfrentar, as linhas do seu próprio destino. A tudo isto se chama enredo, do qual dependem as personagens e sem o qual as mesmas não fariam sentido, ou a sua acção não seria concretizável. Unidos, enredo e personagem fazem parte de um todo consensual, onde a personagem deve parecer tão perto do real quanto possível, deve ter vida , ser um ser vivo aproveitando os limites da sua própria realidade, uma realidade cambiante, que se mascara e se deixa mascarar, sem nos permitir distinguir o seu verdadeiro rosto.

Já Aristóteles, o primeiro teórico a tentar responder ao enigma dos seres ficcionais (categorias integrantes e constituintes do universo narrativo), na sua obra Arte Poética chama a tenção para a estreita semelhança entre a personagem e a pessoa humana, ao afirmar que, sendo o sendo o imitar congénito ao homem “a poesia é uma arte de imitação ou representação” e “o objecto dessa imitação é constituído de homens que fazem ou experimentam alguma coisa” (David Daiches: Posições da Crítica em Face da Literatura, 1967,pp.32e ss.), no entanto este conceito de personagem não se esgota na representatividade desta, mas afirma também a necessidade de considerá-la enquanto produto dos meios e modos utilizados pelo poeta para elaboração da obra.

Tanto no que respeita o teatro como nos relatos narrativos, a personagem constitui o elemento dinamizador sobre o qual se desenrola toda a acção. A história do teatro e a vasta criação narrativa apresentam uma grande variedade de personagens que representam diversas realidades, ou seja há personagens que pela sua individualidade e características específicas, podem aparecer como representantes de uma conduta específica, de uma classe social ou de uma herança literária, como são o caso das figuras cridas por Gil Vicente nos seus autos, estereótipos de uma sociedade e de várias classes sociais que o autor caracterizou, ou ainda a figura do bobo que foi evoluindo de acordo com as épocas, tendo atravessado vários séculos do teatro europeu. Ainda dentro desta caracterização podemos encontrar aquelas personagens que são conhecidas como portadoras de um conjunto de características psicológicas e morais que o público identifica de imediato não só pelo seu aspecto físico como também pela sua conduta. Dentro deste contexto há ainda as personagens que se destacam pelo seu carácter individual e tanto na narrativa como no teatro podemos contar com a originalidade de figuras como D. Quixote, Hamlet ou Madame Bovary.

HERÓI; PROTAGONISTA; FIGURANTE;

BIB.: Antonio Candido et al.: A Personagem de Ficção (9ª ed., 1995); Beth Brait: A Personagem (6ªed., São Paulo, 1998); Edward Morgan Forster: Apects of the Novel (1927); Edward Morgan Forster: Apects of the Novel (1927); Konstantin Stanislavski: Building a Character (1975); António Cândido et al: A personagem de Ficção (1998); Michael J. Hoffman and Patrick D. Murphy: Essentials of the Theory of Fiction ( 2ª ed. 1996); William H. Gass: "The Concept of Character in Fiction", in Essentials of the Theory of Fiction, ed. por Michael J. Hoffman e Patrick D. Murphy (2ºed., 1996).

Rute Miguel

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