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O efeito Bovary: bovarismo

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Termo cunhado em 1892 por Jules de Gaultier a partir do romance de Gustave Flaubert, Madame Bovary, cuja heroína, saturada de leituras romanescas, mede a sua própria, vida pelos parâmetros provenientes da sua experiência de leitora. O bovarismo consiste, assim, numa insatisfação romanesca com a realidade, numa inversão do olhar, e demonstra a incapacidade de assumir uma posição crítica em relação à ficção. O abismo que se abre entre as duas experiências, a da realidade e a do imaginário, confere uma dimensão ao mesmo tempo trágica e irónica ao bovarismo.

A noção inicial de bovarismo estendeu-se e passou a frequentar outros contextos. Assim, a psicologia apropriou-se do termo para referir-se a certos tipos de atitude neurótica em que o indivíduo, desprovido de autocrítica, imagina-se diferente do que ele é, idealizando a sua personalidade, especialmente no campo sentimental. Além disso, na América Latina, o termo vem sendo empregado também com o sentido da alienação intelectual que precede a construção de uma identidade cultural própria; o teórico haitiano Jean Price-Mars é o primeiro a utilizá-lo neste sentido.

Se a noção de bovarismo implica alguma positividade, esta reside no facto de a perpétua insatisfação e o contínuo trabalho da imaginação prefigurarem o desejo de escrita do qual o personagem de Emma Bovary fornece um modelo, embora ingénuo. Assim, a análise do bovarismo proposta por Alain de Lattre descobre, na forma da tolice de Emma e na forma da inteligência criadora de Flaubert, um mesmo princípio: a distância invencível entre o mundo e si, entre si e si mesmo.

Bib.: Alain de Lattre: La Bêtise d’Emma Bovary (1980); Henri Piéron: Vocabulaire de la psychologie (1963); Jean Price-Mars: De St.-Domingue à Haitï: Essai sur les arts et la littérature (1959); Jules de Gaultier: Le Bovarysme. La psychologie dans l’oeuvre de Flaubert (1892).

Paula Glenadel Leal

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